Maior produtor de carne do mundo acusado de apoiar o desmatamento ilegal na Amazônia

A produtora de carne JBS usa o organismo de certificação DNV-GL para se defender das acusações de desmatamento. A DNV-GL nega que seus relatórios absolvam a JBS.

Foto: Rodrigo Baleia / Greenpeace

Em um novo relatório da Anistia Internacional, o produtor de carne JBS é acusado de usar gado que pastou ilegalmente em territórios indígenas desmatados no Brasil. O relatório é apoiado por um novo estudo publicado na Science, que mostra como milhões de toneladas de produtos de desmatamento da Amazônia acabam nos mercados europeus.

Por meio de estudos de caso detalhados, o relatório da Anistia mostra como a carne de fazendas ilegais na floresta tropical está acabando no ponto de desbaste da JBS por meio dos chamados fornecedores indiretos. Devido à falta de sistemas de monitoramento do produtor de carne, a Anistia alega que a JBS viola as diretrizes da ONU de responsabilidade social corporativa e direitos humanos, bem como o chamado "acordo de carne bovina" da indústria de carne.

"O relatório da Anistia é um trabalho significativo, revelando como a indústria pecuária no Brasil ainda é um importante impulsionador do desmatamento na Amazônia, apesar de anos de promessas em contrário, diz Øyvind Eggen", diretor da Rainforest Foundation Norway.

A indústria pecuária é um dos principais vetores do desmatamento no Brasil. Foto: Bruno Kelly/Rainforest Foundation Norway

Alegando ser 99,9% livre de desmatamento

A JBS rejeitou sistematicamente as acusações de contribuições ao desmatamento. Uma parte essencial da defesa da JBS foi a referência aos relatórios anuais de verificação da empresa norueguesa DNV-GL.

Em perguntas da Anistia sobre conformidade com padrões internacionais, a JBS escreveu: "Auditorias independentes realizadas nos últimos seis anos pelos principais auditores DNV-GL e BDO revelam 99,9% de conformidade com esses padrões em geral. Em 2019, 100% das compras diretas atenderam nossos critérios socioambientais."

Reivindicações semelhantes foram feitas a outros stakeholders. No entanto, é necessário um conhecimento aprofundado da indústria pecuária brasileira para descobrir o que os relatórios da DNV-GL não relatam. Nos últimos meses, a Rainforest Foundation Norway discutiu isso em detalhes com a DNV-GL.

Abusando dos relatórios da DNV

Nesta semana, a DNV-GL confirmou que seus relatórios de verificação não podem ser usadospara alegar que os produtos da JBS são livres de desmatamento e que denunciam o abuso de seus relatórios. Em uma carta à JBS e à Rainforest Foundation, eles afirmam:

“Fomos informados de que a JBS está usando o relatório como prova de que suas práticas totais de fornecimento de gado são livres de desmatamento. Portanto, a DNV-GL considera necessário emitir um aviso de isenção. ”

A DNV continua a fornecer uma revisão completa de quais fatores de risco eles não incluíram no relatório de verificação, incluindo o uso extensivo de fornecedores indiretos.

“Dessa forma, o relatório de avaliação não pode, em hipótese alguma, ser usado como evidência de a JBS estar completamente livre de desmatamento”

A declaração é um dos raros casos em que a DNV denunciou publicamente seus próprios relatórios ou o abuso deles.

"Agradecemos que a DNV se posicionou contra o abuso de seus relatórios pela JBS, detalhando publicamente o que os relatórios mostram e não mostram. Também esperamos que o processo leve a uma conscientização ainda maior da possibilidade de tais abusos no futuro" diz Øyvind Eggen, diretor da Rainforest Foundation Norway.

O greenwashing de gado é um problema generalizado. Foto: Søren Hvalkof.

Greenwashing pela indústria de carne

Um problema generalizado do desmatamento causado pelo gado é o uso extensivo de fornecedores indiretos, com a possibilidade de "lavagem de gado", greenwashing através de documentos forjados.

Mais da metade do gado adquirido pela JBS e sua concorrente Marfrig provém desses fornecedores indiretos. No entanto, essa parte da cadeia de suprimentos foi isenta do trabalho de verificação realizado pela DNV. A omissão criou uma base para o uso indevido dos relatórios e a má interpretação da situação do desmatamento de gado no Brasil.

"Enquanto o governo brasileiro optar por desmantelar seus próprios regulamentos ambientais, o risco de se envolver em desmatamento e violações de direitos humanos infelizmente aumenta muito em todo o comércio e interação com o Brasil e os bens brasileiros", diz Øyvind Eggen.

Eggen acredita que políticos e empresas na Europa devem estabelecer requisitos extremamente rígidos para o comércio com o Brasil e para produtos com alto risco de desmatamento, como soja, carne e couro. O recente envolvimento dos investidores, que contém cinco principais demandas para o Brasil, é um bom exemplo disso.

"Nós e nossos parceiros acreditamos que os governos da UE e da Europa não devem entrar em novos acordos comerciais que possam intensificar a pressão sobre a floresta tropical ou legitimar a política brasileira atual, pelo menos até que esses desafios sejam resolvidos", diz Øyvind Eggen, diretor da Rainforest Foundation Norway.